quinta-feira, 27 de março de 2008

O arriscado vôo do arquiteto digital.

- Texto inspirado na entrevista de François Burkhardt a Paul Virilio.

A nova era arquitetônica que surgiu no final dos anos 80, o movimento desconstrutivista, revelou-se baste ousada quanto à formas inusitadas. O desconstrutivismo arquitetônico, assim como o nome sugere, se caracteriza por um desmembramento das formas retilíneas, simula uma aparência de caos e diversas perspectivas. Dentre os grandes arquitetos que vêm seguindo essa filosofia estão Zaha Hadid, Peter Eisenman, Rem Koolhaas, Daniel Lebiskind, Bernard Tschumi, Frank Gehry, dentre outros.Essas formas mais complexas estão diretamente ligadas as novas perspectivas que o computador possibilita à arquitetura. Segundo a entrevista de Paul Virilio, cedida a François Burkhardt, o computador é um importante instrumento que certamente auxilia nas diversificadas formas arquitetônicas, porém quando a imagem mental do projeto é transferida para o computador, a obra acaba sendo modificada pelo instrumento. Esse processo pode ser comparado com a industrialização, a partir do momento em que o artesão deixa de fazer um objeto manualmente e a indústria passa a fabricá-lo, além de perder o valor do esforço humano, fica sujeito à fabricação em massa.O que preocupa o autor e crítico de vários livros a respeito dessa explosão tecnológica, Paul Virilio, são essas novas formas que já são incidentes informáticos. A arquitetura que deveria estar relacionada com a arte dos corpos, a dança, coreografia, hoje nada mais é do que simplesmente uma relação com a visão.A arquitetura, hoje, entrou no mundo da revolução da informática, porém deve-se ter cuidado já que esta não é um objeto qualquer de bens de consumo, é sim o elemento que faz a cidade.Muitas vezes as tecnologias da informática distanciam as pessoas da realidade, já que boa parte da nova geração de arquitetos está convicta que a imagem eletrônica pode oferecer possibilidades infinitas à fantasia. Hoje, segundo Paul Virilio, a adoração ao computador faz muitas vítimas que acabam se afastando do mundo atual para viver no mundo virtual.

Peter Eisenman

Peter Eisenman, arquiteto norte americano nascido em 1932 (New Jersey), é graduado, pós-graduado, mestre e phd. Conhecido mundialmente com “pai do descontrutivismo”, já que as suas praticas e teóricas são voltadas a esse movimento, estudou bastante suas teses antes de colocá-las em prática. Suas publicações foram inspiradas em filósofos como Jacques Derrida, e também é classificado com um crítico da arquitetura.
A maneira que Eisenman encontrou para despertar o sentimento de desestabilidade nas pessoas e gerar novas respostas, foi distorcer as formas e espaços, fazendo com que elas se sintam desconfortáveis diante de suas obras, já que para ele esse é uma experiência vital para a arquitetura.
Entusiasmado de criar projetos no computador, Peter Eisenman entra em uma nova fase no final dos anos 90. O arquiteto teve seu primeiro contato com o instrumento precisamente em 1992 e a partir daí os programas, como exemplo AutoCad, tornaram muito mais cômodos a realização de projetos e permitindo cada vez mais formas mais ousadas. Essa foi a época em que o arquiteto foi mais criticado, já que suas ideologias sofreram acréscimos teóricos e algumas mudanças. O encontro que antes se dava com os filósofos, hoje também se dá com a máquina de computador.
Peter Eisenman afirma que a sua arquitetura sofreu mudanças sim, isso porque a sociedade contemporânea está também em constante mudanças. Os costumes dos anos 70 já não seriam mais os mesmo dos anos 90.
“Não sou rebelde, obedeço ao meu próprio ritimo. Consigo continuar a construir. Construo um em cada vinte projetos que desenho, mas prefiro esta solução a repetir continuamente o que já tinha feito anteriormente.” (Peter Eisenman, 1991).
Hoje, o interesse do arquiteto é voltado para formas arquitetônicas distorcidas, curvadas e estruturadas em que os softwares ajudam bastante. Apesar dessa mudança, o seu conceito de provocar sensações nas pessoas persiste em sua obras,já que sua intenção não é que os espectadores observem apenas a forma, mas que também que eles se comuniquem com a edificações e sintam sua vibração.
“Procuro formas de conceitualizar o espaço, de modo a colocar o sujeito em uma relação deslocada, pois não irão encontrar referências iconográficas as formas tradicionais de organização. Foi o que sempre tentei fazer, obrigar o sujeito a reconceitualizar a arquitetura.” (Peter Eisenman, 1992).

- Cidade da Cultura:

Cidade da Cultura em Santiago de Compostela, é um projeto ousado e retrata a nova fase computadorizada de Eiseman. Nesse projeto o arquiteto utiliza a topologia como o principal elemento de suporte para o seu projeto. A planta é formada a partir de um conjunto de linhas com curvaturas e parâmetros que foram ao poucos sendo ajustadas até suportarem todas as necessidades que o centro cultural precisava. O suporte tecnológico de softwares foram fundamentais para a elaboração do projeto que também é conhecido como “montanha construída”, já que a forma da obra que foi beneficiada pela sua topografia natural sugere isso.
A edificação acaba se confundindo com o terreno tornando discreta diante de outros projetos do arquiteto. Os edifícios que compõem a cidade da cultura estão literalmente talhados no terreno para dar a idéia em que os edifícios e a topografia se fundem no terreno.

Maquete virtual da Cidade da Cultura

Maquete da Cidade da Cultura


-Wexner Center for Visual Arts:

Situado em Ohio, O Wexner Center for visual arts é o centro de artes visuais da uiniversidade de Columbia. Foi concluída em 1989 e foi inspirada nas torres de uma fabrica que existia antes no local. Espécies de andaimes metálicos são um dos elementos que mais chamam atenção na fachada. A torre fragmentada é o marco principal da fachada sul do projeto. Emboara aparente ser uma construção de planta térrea, o subsolo do projeto está cheio de compartimentos. Antes desse projeto Eisenman só tinha executado obras de pequeno porte, então esse centro é um marco importante para o aprimoramento de projetos maiores a partir daí.

Wexner Center for Visual Arts

Wexner Center for Visual Arts

-Aronoff Center for design and art:

Concluído em 1996, o Aronoff center for design and art foi construído compondo um enorme campus da universidade de Cinccinnat em Ohio. Segundo Peter Eisenman, as formas da construção tiveram origem a partir da topografia do terreno e dos ângulos de edificações existentes em torno do local, provocando um comunicação também com o seu entorno.
Com o projeto, Eisenman teve a intenção de provocar um desfio de como as pessoas são educadas. A edificação demorou muito a ser concluídas, por isso a concepção do projeto poderia até não corresponder mais ao pensamento de Eisenman na época, porém continua a provocar a sensação de desconforto diante da obra.


Aronoff Center for design and art

-Memorial do Holocausto:

O polêmico projeto efetivado em memória dos judeus executados na Europa, Peter Eisenman recorreu novamente a idéia do solo como solução. Das ruas próximas ao local é possível avistar uma superfície de 2700 blocos retangulares de concreto com alturas diferentes.
O arquiteto teve a intenção de fazer com que as pessoas se sentissem
desorientadas, assim como as vítimas do holocausto. A arquitetura do memorial proporciona as pessoas uma experiência espacial. O memorial tem uma força de um cemitério, como se varias lápides se erguessem do solo.


Memorial do Holocausto

Frank Gehry


Nascido no Canadá em 1929 , Frank O. Gehry se destaca hoje como um dos maiores arquitetos contemporâneos da atualidade, pelas suas obras complexas e escultóricas. Desde pequeno criando pequenas maquetes de cidades com lascas de madeira; teve sua adolescência voltada a arte e a escultura. As suas obras não primam pela leveza, o que garantiu a ele o apelido crítico de caminhoneiro, já que quando criança acompanhava o pai nas viagens de caminhão. A truculência dos seus tratos retrata a sua personalidade, fanático por hockey e ex-lutador de boxe e artes marciais.

Por incrível que pareça, Frank sempre foi um típico norte americano, o qual até metade da sua carreira ainda produzia obras convencionais. Se formando pela Universidade de Southern, na Califórnia, foi pouco conhecido até os seus 50 anos de idade, Frank começou a entrar no mundo da mídia quando foi incluso na mostra sobre desconstrutivismo liderada por Philip Johnson. Suas produções de inicio eram inspiradas por grandes obras de Frank Lloyd Wright e de visão clássica modernista.
Hoje suas construções dão a impressão de uma obra improvisada em andamento, agrupando formas modernas como se fossem ao acaso. Olhando de fora, a construção parece um conjunto em pedaços, mas quando visualizamos o interior da mesma, sentimos a combinação das unidades e sua seqüência espacial harmoniosa. Chamada por ele de “arquitetura sovina”, Gehry preza pelo baixo custo, destruição, distoriçao, ilusão, formação de camadas e surrealismo, se utilizando de materiais faz tudo como metal corrugado, madeira compensada e material de construção de cercas em cadeia.
Assim como Niemayer, Gehry, antes de ser tornar um arquiteto, já exercia o papel de escultor e desta mesma forma ele trata suas obras arquitetônicas. Indo contra muitos críticos, Gehry, acredita que a “boa arquitetura” não se baseia em formalidades, por isso a presença forte da plasticidade em seus projetos.
Assim como Niemayer, para eles a plasticidade nem sempre é significado de beleza para a maior parte das pessoas. Projetam obras que são consideradas feias e sem a genialidade, podendo citar palavras do próprio Gehry sobre esse assunto, onde com sua personalidade irônica diz, “Estou confuso em relação ao que é feio e ao que é bonito,”.
Lutando contra a revolução tecnológica do século XXI, Gehry ainda é adepto à simplicidade dos poetas do traço livre, concebendo as suas obras a partir de croquis desenhados a mão. Apesar de trabalhar com desenhos e maquetes, muito dos seus projetos são bem complexos, o que faz com que seja necessário o auxilio de softwares especializados para a estruturação de suas idéias. Frank em si não desenha em computador, embora tenha equipes de profissionais altamente treinados em sofisticadas tecnologias para dar assessoria aos seus surtos de genialidade.
Para viabilizar as superfícies curvas contínuas de seu projeto, Gehry recorreu ao programa Catia, um modelador tridimensional que é utilizado no design. O programa mapeia as superfícies curvas, e através de números e dados geométricos, encontra soluções esculturais que garantem a relação entre geometria e a viabilidade de construção.
Gehry pensa na arquitetura desde sua concepção de projeto, como simples volume plástico e objeto escultório. Suas obras tem que proporcionar surpresa e emoção nas pessoas acima de tudo, por isso se/utiliza de formas curvilíneas e o uso sofisticado de materiais “high tech”, ao contrario das obras singelas, sofisticadas e de desenhos limpos de Niemeyer. Tudo é questão de tempo e evolução, nesse caso se deixando levar pela evolução das indústrias tecnológicas, já que Frank se utiliza de materiais caros e sofisticados da arquitetura de impacto na mídia do século XXI, enquanto em sua época modernista da década de 1950/60 Niemeyer se utilizou de um material barato de terceiro mundo, sendo ele o concreto.
Cada idéia, cada traço criado no papel reflete sentimento e espírito.
Contradições entre interno e externo, desequilíbrio e harmonia, beleza e caos são traços próprios da arte e não se pode cobrar motivos nem razões para tal. Cada um representa sua visão do mundo da forma em que achar correta e viável. Gehry ao invés de criar um bloco e soltá-lo na terra, cria uma escultura integrada ao seu entorno, refletindo as críticas e problemáticas do local.
Nos subúrbios da cidade espanhola de Bilbao, às margens do rio Nervión, próximo a uma velha ponte, Frank Gehry dá a luz a mais um projeto genial. Analisando o entorno e se baseando na temática náutica, surgi daí uma arquitetura revestida em pele de titânio: o Museu Guggenheim. A camada externa de sua construção é revestida de pedra e metal torcidos, curvos e salientes, criando assim a idéia de um navio ancorado às margens do rio. Ao lado de sua obra existe uma antiga ponte que se incorpora na estrutura escultórica.
“Estar na curva de um rio industrial cruzado por uma grande ponte que conecta o tecido urbano de uma cidade densamente povoada às margens do rio, com um lugar dedicado à arte moderna é minha idéia de paraíso” (Frank)
Frank não adota a teoria de desenhos “puros” que limitam os arquitetos aos espaços projetados, por isso defende o contato com o mundo, criando um clima de harmonia no caos, e no agrupamento de diferentes estilos nas edificações do seu entorno. Ao eleger o projeto de Gehry, as Instituições Bascas renovaram o compromisso da Fundação Guggenheim com o desenho inovador.
A proposta arquitetônica de Gehry fala por si mesma sem haver a necessidade de procurar significados específicos para cada elemento construtivo. Suas idéias são ditas através da ocupação sensorial do espaço e das escolhas de materiais e pontos de luz. Um grande hall de 50 metros de altura é o coração do museu. Toda a sua superfície é revestida de vidro, marcando a entrada principal, e daí seguem os demais ambientes. È como se tudo funcionasse ao redor de um oco espacial interior, cheio de luz e transparência, assim como as torres de escadas e elevadores que são recobertas por peles de vidro. Pode-se pensar que é Estética x Funcionalismo já que a estrutura é elevada e autônoma que não tem função, mas de acordo com as palavras do próprio arquiteto, “terá uma importância urbanística crucial”. Um mistério construtivo sem solução, funcionalidade ou explicação.
Os materiais usados produzem uma estratégia de luz, onde a estrutura é elaborada com paredes de concreto e um sistema reticular de aço que se ajustam as formas curvilíneas da arquitetura. A estrutura de aço é composta por peças triangulares que representam as redes dos pescadores. Quanto aos materiais de revestimentos, os mesmo produzem uma agradável percepção tátil: resinas nos pisos, borrachas, ferros vidros, amplas superfícies brancas que passam diferentes sensações.
Por fim, a luz é trabalhada através do uso de peças de titânio, que é um material muito usado em naves espaciais. A luminosidade conforme a ocasião, é refletida de diferentes formas, tanto refletindo a luz do dia quanto a vinda das águas. Seu exterior se adapta ao entorno de forma harmoniosa, apesar de suas curvas complexas, o que não impede que por sua vez, seu interior não seja aconchegante e funcional.